domingo, 24 de agosto de 2014

DESCASO Leis caem no esquecimento e são descumpridas em Fortaleza

Fonte: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/
24.08.2014
População ignora normas como a do Sinal de Respeito, que indica que o motorista pare para o pedestre passar

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O condutor deve parar quando o pedestre sinalizar que deseja atravessar, mas não é o que acontece
FOTO: FABIANE DE PAULA
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É proibido o uso de cigarros e derivado ou não do tabaco em recinto coletivo, segundo a Lei Antifumo. A regra agrada a parte da população que se sentem incomodada com a fumaça e o cheiro produzido pelo uso do cigarro
FOTO: KIKO SILVA
Para que uma lei funcione adequadamente, é necessário que o poder público fiscalize e, se for preciso, aplique sanções contra aqueles que as que transgridem. No entanto, o que se percebe em Fortaleza é que muitas normas não são cumpridas, seja por falta de punição ou simplesmente porque caem no esquecimento da população.
Na Capital, para atravessar as ruas e avenidas em segurança, basta que o pedestre utilize um gesto que indique o desejo de fazer aquela travessia, seja na faixa de pedestre ou a 50 metros dela. Pelo menos é o que diz a Lei Municipal 10.206/2014, denominada de Sinal de Respeito, que entrou em vigor no fim do último mês.
Porém, não é isso que se vê nas vias da cidade. Os pedestres passam pela faixa somente quando o semáforo fecha e os veículos realmente param. Nos locais onde existe apenas a sinalização, a vida de quem anda a pé fica mais difícil.
Até mesmo na Avenida Beira-Mar, um dos poucos locais onde a faixa é respeitada, as pessoas mostram desconfiança para atravessar a via. Somente quando todos os carros e motos param é que os cidadãos se sentem seguros para fazerem a travessia apressadamente.
O estudante de Engenharia Elétrica Daniel Falcão não acredita que a Lei do Sinal de Respeito possa dar certo sem a aplicação de multas e campanhas educativas. "Infelizmente, em Fortaleza, além da legislação, também é preciso colocar propagandas nas TVs, rádios e jornais para tentar educar o povo", avalia.
Para ele, se em capitais como Brasília os condutores passaram a respeitar a sinalização, isso pode acontecer também na Capital. "Em Brasília, por exemplo, os motoristas param para passar na faixa de pedestre. Em Vitória (ES), eu via com mais frequência do que em nosso Estado. Aqui, quem colocar a mão pedindo para parar vai ser amputado", brinca Daniel.
Bebida alcoólica
Desde outubro de 2007, a Lei Municipal 9.275 proíbe o consumo de bebidas alcoólicas nos postos de combustíveis de Fortaleza, entre 20h e 8h. Entretanto, basta um passeio rápido pela cidade para observar que a regra não é cumprida.
O arquiteto João Barros Laprovitera já perdeu as contas de quantas vezes foi até um posto de combustível e ingeriu bebida alcoólica. "Tenho o costume de ir a postos comprar cerveja e, por vezes, fico no local bebendo e nunca soube dessa lei", diz.
Apesar de nunca ter sido alvo de alguma campanha educativa, o arquiteto acredita que ela seja importante para evitar acidentes de trânsito. "É uma lei que, na minha opinião, complementa a Lei Seca", disse.
Aplicação
De acordo com o doutor em Sociologia e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Clesio Arruda, para que a norma funcione não basta apenas elaborá-la. É preciso que as regras e multas sejam aplicadas.
"Não precisa aplicar uma pena elevada. É possível resultados mesmo com um custo em dinheiro, pequeno. Pois assim, o valor mesmo será o pedagógico. Se não tiver multa, a lei é praticamente inexistente", afirmou o professor universitário. Ele acrescenta que outro problema é que a cultura brasileira tem grande resistência às normas. Para o sociólogo, quando existe uma fiscalização, logo se começa a falar de "indústria da multa".
O professor de Ciência Política da Unifor Francisco Moreira Ribeiro comentou que para, uma lei dar certo, é importante que seja feita uma publicidade e, assim, a população entre em consenso da necessidade da regra.
Associado a isso, ressaltou Ribeiro, é preciso utilizar a capacidade do poder público de fazer valer a lei. "É preciso fiscalização e sanções para que o infrator seja convencido a cumprir a lei", destaca o professor.
Em casos como o da Lei 10.206/2014, o professor da Unifor relata a importância de educar não apenas o motorista, mas também os pedestres. "As leis são feitas sem a preocupação de serem implantadas", analisa.
A assessoria de comunicação da Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de Cidadania (AMC) informou que não existe punição para quem infringir o Sinal de Respeito, pois precisaria de uma regulamentação.
Em 2007, quando a Lei 9.275 começou a vigorar, a fiscalização ficava por conta da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Controle Urbano (Semam), que hoje é a Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma). Mas, a assessoria do órgão informou que não fiscaliza nada relacionado ao consumo de bebidas.
Regras podem mudar hábitos
Até algum tempo atrás, o hábito de fumar era comum em Fortaleza, os motoristas e passageiros de veículos utilizavam cinto de segurança somente quando trafegavam nas estradas e as filas com prioridade de atendimento aos idosos eram desconhecidas. Nesses casos, os hábitos da população mudaram somente após a aplicação de leis que acabaram dando certo.
No Ceará a Lei 14.436, de 2009,determina que é proibido o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou de qualquer outro produto fumígero, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo seja público ou privado. Os estabelecimentos que não cumprirem podem ser multados e até interditados pelo período de 48 horas.
"Hoje em dia, nem sei se precisamos mesmo dessa lei, pois é muito difícil mesmo ver alguém fumando em um local fechado ou em público. Mas, quando isso acontece, a pessoa é vista com tanta reprovação pela maioria dos outros cidadãos em sua volta que acaba desistindo de fumar na mesma hora", comentou o contador Victor Bezerra.
Ele acredita que o fato de o cigarro fazer mal para a saúde tanto daqueles que fumam quanto dos que estão ao seu redor faz com que muitas pessoas reprovem o uso do tabaco com muita facilidade. "Além disso, ainda tem a fumaça e o cheiro forte. Apenas quem fuma gosta daquilo", acrescenta.
O artigo 65 da Lei Federal 9.503, de 1997, é claro quando diz: "É obrigatório o uso do cinto de segurança para condutor e passageiros em todas as vias do território nacional". Desde então, muitas campanhas educativas foram realizadas em todo o Brasil e o uso do equipamento se tornou parte da rotina de quem dirige e dos passageiros.
O autônomo Jorge Luís Meireles diz que, hoje, ao entrar no carro, automaticamente, já coloca o cinto de segurança. "Quando eu estou no carro e vejo alguém sem o cinto, digo logo para colocar. Pois, além de ser mais seguro, em caso de acidente, não vou levar uma multa grande e perder os pontos na carteira", destacou
A Lei 10.048, de 2000, destaca em seu primeiro artigo que as pessoas portadoras de deficiência, os idosos, as gestantes, as lactantes e as pessoas acompanhadas por crianças de colo terão atendimento prioritário.
"Hoje em dia o idoso chega em um local com fila ele é prontamente atendido. Esse foi o lado bom de ter passado dos 60 anos. Não sei mais o que é ficar em fila de bancos ou caixas lotéricas", brincou o aposentado Mathias Domingues.
Infrações
De acordo com dados fornecidos pelo Departamento Estadual de Trânsito (Detran-CE), em 2012, foram flagrados 19.315 condutores transitando sem uso do cinto de segurança. Em todo o ano passado, esse número diminuiu para 12.993. Portanto, houve uma queda de 32% no número dessas infrações. Até o último dia 20 de agosto o Departamento multou 6.710 motoristas.
Em Fortaleza, a Célula de Vigilância Sanitária e Ambiental do Município (Cevisa) é responsável pela fiscalização da Lei antifumo. De acordo com a assessoria da Secretária Municipal de Saúde (SMS), a Cevisa exerce suas atividades através de ações educativas em datas temáticas. Além disso, são feitas as ações de fiscalização de rotina propriamente ditas nas quais também é observado o cumprimento das legislações referentes ao tema.
Legislação depende de população e políticos
As leis são importantes para que os direitos e deveres de toda a população sejam atendidos de forma satisfatória. Porém, para que isso realmente possa dar certo é preciso que os cidadãos tenham conhecimento de quais são os seus direitos e também que os legisladores contribuam mais para a vida política de todo o seu pais.
Para o professor de ciência política da Universidade de Fortaleza (Unifor), Francisco Moreira Ribeiro, as pessoas vão conseguir conviver com as normas somente quando tem a consciência sobre quais são os seus direitos naquela sociedade. "Dessa forma será mais fácil para que a população possa cumprir as regras", frisou.
Acompanhamento
O doutor em sociologia e também professor da Unifor, Clesio Arruda, destacou que para as leis funcionarem de forma adequada é significativo que os legisladores acompanhem as ações do poder executivo. Mas, não é isso que se vê no dia a dia das casas legislativas. "É mais importante acompanhar obras e denunciar problemas do que trabalhar para mudar nomes de ruas ou criar datas festivas", concluiu Arruda.
FIQUE POR DENTRO
Criação de leis passa por diversas etapas
Para que uma lei seja criada são necessárias várias etapas. Primeiramente o poder legislativo ou executivo deve propor uma norma. Em seguida, a proposta entra em discussão no legislativo, que podem ser os senadores, deputados ou vereadores.
Depois que foi aprovada pelo poder legislativo, o responsável pelo executivo, que podem ser o presidente, o governador ou o prefeito, precisa sancionar a lei, sem a qual ela não tem validade. Sancionar é declarar sua aprovação. Nesse momento, ele pode vetar artigos e aprovar a lei sem eles.
A lei só vale mesmo quando publicada no Diário Oficial, seja da União ou dos estados. Quando o executivo veta a lei, ela volta para o legislativo e, depois de uma nova votação, pode passar a valer mesmo não tendo sido sancionada pelo chefe do executivo.
Thiago Rocha
Repórter

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