sábado, 2 de maio de 2015

Em 2 anos, 164 pessoas foram resgatadas do trabalho escravo no Ceará

Fonte: http://www.opovo.com.br/
02/05/2015
O trabalho escravo persiste no Ceará em áreas como pesca, produção de melão, cana-de-açúcar, extração da cera de carnaúba. De 2013 a 2014, 164 pessoas foram resgatadas em condições de trabalho degradantes no Estado


Samaísa dos Anjos

samaisa@opovo.com.br


SÉRGIO CARVALHO/ESPECIAL PARA O POVO
Foto do livro Às vezes, criança, de Rubens Carvalho e Rubervam do Nascimento, auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego
A história é contada de geração para geração: o trabalho dignifica. A máxima aprendida desde cedo, no entanto, está longe da realidade de milhares de trabalhadores que têm a dignidade ignorada pelo trabalho escravo no Brasil. No Ceará, em 2013 e 2014, 164 trabalhadores foram resgatados do trabalho escravo.
 Nos flagrantes da fiscalização são encontradas pessoas trabalhando sem qualquer equipamento de segurança, dormindo embaixo de árvores ou lonas durante meses, com condições sanitárias inadequadas, bebendo da mesma água dada aos animais, sem jornada fixa, trabalhando sob ameaça, sem liberdade.

No Estado, a extração da cera de carnaúba, produção de melão, cana de açúcar, pesca estão entre as atividades que ainda utilizam trabalhadores em situação degradante. A conceituação do trabalho escravo no Brasil abrange as condições degradantes, a jornada exaustiva, o trabalho forçado e a servidão por dívida, que podem acontecer separadamente ou juntos.

O procurador do trabalho Jonas Ratier Moreno, da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo no Ministério Público do Trabalho (Conaete), afirma que a escravidão contemporânea possui grilhões menos visíveis aos olhos, mas com semelhanças com o trabalho escravo histórico e elementos que dialogam com o cenário e contexto atual.
 
Combate
Para Sérgio Carvalho, coordenador de fiscalização rural da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Ceará (SRTE), este é o pior momento no combate ao trabalho escravo no Brasil desde que a estrutura governamental para atuar na área foi montada em 1995 com projetos que podem descaracterizar o atual conceito e abrir espaço para mais casos. Outro ponto de preocupação é a defasagem severa dos quadros de auditores fiscais, ressalta Sérgio. 

Como em tantas outras esferas, a impunidade é elemento crucial para que empresas continuem praticando o trabalho escravo. “A Justiça não conseguiu acompanhar com a mesma intensidade os casos constatados na esfera administrativa”, comentou Carvalho.

Ele avalia que a vulnerabilidade, a impunidade, o sistema de produção e busca de lucro e a fiscalização deteriorada tornam muitos campos abertos para a escravidão. No momento dos flagrantes, Sérgio relata o alívio dos trabalhadores, mas também a dificuldade de reconhecimento de muitos de si mesmos como escravos, levando em consideração a educação e conscientização que faltam.

“Eles têm uma gratidão por estarem sendo resgatados. Muitos deles não tinham documentos. É o reconhecimento e resgate da cidadania do trabalhador”, pontua Sérgio Carvalho.

Saiba mais

Lista Suja
Empresas que foram autuadas com casos de trabalho escravo faziam parte de uma Lista Suja disponível para a sociedade. Em julho de 2014, o cadastro tinha mais de 600 empresas. 

No entanto, no fim de 2014, liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a Lista Suja, respondendo a pedido da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc).
 
Três meses depois, o Governo Federal lançou nova portaria interministerial recriando o cadastro com empresas autuadas pelo trabalho escravo. Até agora, no entanto, a “nova” lista não foi disponibilizada.
 
Defasagem no quadro
O trabalho de fiscalização, planejamento e resgate depende de profissionais, como os auditores fiscais do trabalho. Mas a defasagem dos quadros dos auditores impacta negativamente na capilaridade da atuação. 

Há a espera por concurso com 800 vagas, mas o número não supriria a necessidade, ressalta Sérgio Carvalho, da SRTE.
 
Resumo da série
O POVO deu início ontem a uma série de matérias em alusão ao Dia do Trabalho. A primeira reportagem tratou a exploração do trabalho infantil.

Serviço
Denúncias
Disque 100.
A Superintendência Regional do Trabalho e o Ministério Público também recebem denúncias.

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