06/12/2015
A atitude de apontar culpados e proferir sentenças no calor dos acontecimentos das redes sociais pode respingar na vida real. O POVO.dom traz diferentes leituras de internautas sobre agressividade e intolerância no "tribunal do Facebook"
CAMILA DE ALMEIDA
Fernanda lembra que, quando os indivíduos estão nas redes sociais, estão expostos aos outros usuários
Manhã de 12 de novembro. A população recebe a notícia da maior chacina da história de Fortaleza, na Grande Messejana. Onze mortos na madrugada, três linhas de investigação em curso e incontáveis comentários nas redes sociais determinando culpados e motivações para os crimes. São textos apontando quem merece morrer ou sobreviver na periferia.
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Algumas das “sentenças” precisaram mudar na tarde do dia 13: chegava a informação de que nenhuma das vítimas tinha envolvimento com crimes considerados violentos. Não caberiam, portanto, na justificativa do “bandido bom é bandido morto”. Mas, aí, as condenações já estavam espalhadas pela Internet — especialmente no Facebook, onde todos parecem se sentir prontos para opinar, espalhando, muitas vezes, discursos de ódio e intolerância.
Nem campanhas de conscientização escapam das críticas e possibilidades de embate nas redes sociais. Os textos com a hashtag #meuamigosecreto, nas últimas semanas de novembro, se propuseram a revelar situações cotidianas da cultura machista. E as críticas chegaram com a mesma hashtag, com ofensas, violência e tentativas de desmoralização dos relatos.
O julgamento sumário nas redes sociais saiu do discurso e teve desfecho cruel em Guarujá (São Paulo), em maio do ano passado. Aos 33 anos, a dona de casa Fabiane Maria morreu dois dias após ser espancada pelos moradores do bairro Morrinhos. Eles haviam confundido Fabiane com uma mulher de fisionomia semelhante, exposta em uma página do Facebook como sequestradora de crianças.
As interfaces simples das redes sociais dão aos usuários liberdade para compartilhar fotos, textos, vídeos e, especialmente, comentários. Do celular, do tablet, do computador. Mas nunca se deve esquecer o que o “publicar” significa. Afinal, a “vida online” é, cada vez mais, a “vida real”. E as opiniões, independentemente de onde foram divulgadas, podem interferir no cotidiano alheio. “Tudo precisa ser muito bem pensado”, lembra a publicitária Fernanda Aragão.
Intolerância
Expressar a opinião deveria ser o primeiro passo para o diálogo. Mas, se os posicionamentos já surgem fechados à negociação, as diferenças se acirram e podem potencializar agressividade, violência e discursos de ódio, analisa o psicólogo Edmilson Pereira, membro do Laboratório de Psicologia em Subjetividade e Sociedade (Lapsus), da Universidade Federal do Ceará (UFC). Em casos de “juízos absolutos”, ele prefere não insistir em convencer o outro. Outra opção é estimular, cordialmente, que se conheça mais sobre o assunto debatido.
Frase
“É importante se perguntar por que estou fazendo isso e quem vai receber”
Fernanda Aragão, 33, publicitária e mestranda em Administração
REFLETIR ANTES DE COMPARTILHAR
Fernanda Aragão, 33 anos
Publicitária e mestranda em Administração
Menor noção do contato humano, mais coragem em se expressar longe do interlocutor, impulsividade da interação em tempo real. Esses fatores deixam as gerações Y e Z mais propensas a comportamentos agressivos nas redes sociais. Ao contrário dos que estão entre os 25 e 45 anos, a geração X (nascidos entre 1960 e meados da década de 1970) tende a ponderar as publicações até pela pouca familiaridade com as ferramentas, lembra Fernanda Aragão.
Com foco de pesquisa em Marketing de Marcas, ela ressalta que empresas e pessoas, quando inseridas nas redes sociais, estão expostas aos outros usuários, sempre prontos a avaliar comportamentos. Neste cenário, o equilíbrio é conquistado com a reflexão antes de se publicar qualquer coisa. “É importante se perguntar por que estou fazendo isso e quem vai receber. As pessoas podem não lembrar que tudo cai em domínio público facilmente”, alerta.
Além dos danos ao outro, mensagens de ódio e julgamento podem ter implicações também na vida dos autores. É que o Facebook agrega familiares, colegas de trabalho, chefes… E as ferramentas que restringem as publicações a certos grupos são pouco utilizadas. Como enfatiza Fernanda, as manifestações — agressivas ou não — chegam a todos e podem prejudicar relações profissionais, por exemplo. “É preciso refletir sobre o que é pertinente que todos saibam. O Whatsapp é uma opção para direcionar assuntos específicos aos grupos de interesse”, orienta. (Thaís Brito)
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