28.04.2013
Quase dois anos após as denúncias de desvios de verbas no Interior, são poucos os resultados efetivos da investigação
Dos 92 processos abertos no Tribunal de Contas do Estado (TCE) para apurar irregularidades no episódio conhecido como "escândalo dos banheiros", que veio a público em 2011, apenas um deles foi julgado até o momento. Além disso, quase um ano após ter sido instaurado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o inquérito 780, que investiga a participação de envolvidos no episódio, inclusive o ex-presidente do TCE, Teodorico Menezes, ainda está em andamento na Corte Especial daquele Tribunal, e o Ministério Público Federal ainda não ofereceu a denúncia sobre o caso.
O presidente do TCE, Valdomiro Távora, diz que a demora nos processos se dá pela dificuldade em encontrar os integrantes das associações FOTO: MARILIA CAMELO
Até agora, 30 dos 92 processos foram convertidos em Tomada de Contas Especial, mas ainda não foram apreciados pelo Pleno. O projeto da Secretaria das Cidades que previa a construção dos kits sanitários no Interior do Estado estava orçado em R$ 17 milhões e, devido às irregularidades encontradas nos convênios de algumas cidades, como Pindoretama e Pacajus, o Ministério Público fez um levantamento de todos os convênios estaduais com esse fim.
Somente o processo referente ao convênio de Pacajus, que liberou R$ 400 mil para a construção de 200 banheiros, foi julgado pelo Tribunal de Contas do Estado, em dezembro do ano passado. Em decisão que considerou irregular o referido convênio, o Tribunal condenou mais de uma dezena de pessoas, imputando débito de quase R$ 455 mil aos responsáveis, além da aplicação de multa, cujo valor mais alto foi contra Thiago Barreto Menezes, presidente da Sociedade de Proteção e Assistência à Maternidade e à Infância de Pacajus, de R$ 227.434,09.
O voto da relatora Soraia Victor, que previa multas ao atual e ex-secretários de Cidades por responsabilidade solidária, foi vencido. As contas dos gestores Joaquim Cartaxo e Camilo Santana, atual secretário, foram julgadas regulares com ressalva "pela ocorrência de leves infrações à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, operacional e patrimonial". O voto da relatora foi para que os dois tivessem as contas consideradas irregulares.
Multa
Por sua vez, o ex-secretário Jurandir Santiago, que também chegou a ser presidente do Banco do Nordeste, foi condenado a multa de quase R$ 91 mil. Ele também teve as contas desaprovadas "na qualidade de signatário do convênio". Entretanto, de acordo com presidente do TCE, Valdomiro Távora, as multas aplicadas no julgamento do processo de Pacajus, ainda não foram recolhidas, pois as partes recorreram da decisão, e os recursos não foram julgados.
De acordo com a conselheira Soraia Victor, o Tribunal ainda está convertendo alguns dos processos em Tomada de Contas Especial. Segundo garante, embora a maior parte ainda não tenha sido votada pelo Pleno, o que se percebe até agora, nas avaliações prévias, é que há irregularidades na maioria deles. "Foram levantados todos os convênios. Verificou-se que a grande maioria tem problemas", aponta.
O próximo processo que deve chegar à Corte para julgamento é referente ao convênio do município de Ipu, cujo dano é estimado em mais de R$ 3 milhões, que deveriam ter sido direcionados à construção de 2.108 banheiros. O Tribunal de Contas do Estado está ouvindo as partes envolvidas, dentre elas secretários municipais, construtoras e o ex-prefeito Sávio Pontes, tendo em vista que o convênio foi firmado entre a Secretaria das Cidades e a Prefeitura Municipal.
O caso de Ipu é um dos mais emblemáticos, não chegando a haver nem a intermediação de associações; os convênios foram assinados pela própria Prefeitura. Em junho de 2012, Sávio Pontes chegou a ser afastado do cargo, atendendo à decisão do Tribunal de Justiça do Ceará, que decretou a prisão dele e de outros 15 envolvidos no esquema.
Após a novela que se instaurou na cidade, tendo em vista que o caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) devido aos recursos impetrados, o auge da polêmica ocorreu em novembro do ano passado, quando o então prefeito retornou à Prefeitura Municipal. Na ocasião, ele enfrentou duros protestos da população pela sua volta. Nas últimas eleições, ele ainda tentou se candidatar novamente, mas foi barrado pela Lei da Ficha Limpa.
Inspetorias
O conselheiro do TCE Edilberto Pontes, relator das Tomadas de Contas referentes a Cascavel, Horizonte e Pindoretama, afirma que pediu urgência à secretaria de controle externo do Tribunal sobre o resultado das inspetorias. Por sua vez, a secretária de controle externo do TCE, Giovanna Adjafre, diz que as inspetorias já são orientadas a priorizar esses processos, "até pela repercussão que o caso gerou".
Edilberto Pontes também argumenta que a demora no julgamento desses processos se dá principalmente pela dificuldade em encontrar todas as pessoas citadas para que elas sejam ouvidas, uma média de 25 envolvidos em cada um. "Se na Capital já é difícil, imagina no Interior", compara.
O presidente do TCE, Valdomiro Távora, também justifica a longa lista de pessoas envolvidas como um dos entraves para a celeridade dos processos. Ele explica que defendeu que fossem citados apenas presidente e tesoureiro das associações que assinaram os convênios, mas o Pleno votou para que todos os membros fossem ouvidos.
O escândalo dos banheiros ganhou corpo em 2011, com as denúncias de irregularidades inicialmente em Pindoretama, Pacajus, Horizonte, Cascavel e Chorozinho. De acordo com o promotor de Justiça Eloilson Landim, da Procuradoria dos Crimes contra a Administração Pública (Procap), o Ministério Público Estadual já fazia um acompanhamento desses convênios, mas foi só com a repercussão das denúncias que o órgão fez um levantamento da situação em todo o Estado do Ceará.
Inquérito
O processo judicial criminal em relação a esses primeiros municípios investigados está tramitando em Brasília, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), no inquérito 780. De acordo com o endereço eletrônico do STJ, o processo deu entrada no último dia 04 de abril na Coordenadoria da Corte Especial. A relatora é a ministra Nancy Andrighi. São citadas pessoas ligadas ao ex-presidente do TCE, Teodorico Menezes, e ele próprio diversas vezes. Por ter foro privilegiado, ele está sendo investigado pelo STJ.
No primeiro relatório da ministra Nancy Andrighi, ainda de 2012, consta: "Pelo que se apurou, as verbas repassadas às mencionadas associações ao que parece jamais reverteram para a implantação do projeto a que se destinavam, tendo, na prática, favorecido pessoalmente sócios e administradores dessas entidades e terceiros, entre eles Teodorico José de Menezes Neto, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Ceará, e Teodorico José Barreto Menezes, deputado estadual".
O texto da ministra ainda diz: "Tudo indica que o próprio projeto de construção dos módulos sanitários foi idealizado com vistas a viabilizar o desvio das verbas, inclusive com a prévia definição de quais seriam as entidades beneficiadas, todas ligadas entre si, sendo certo que esse elo tem como ponto comum a pessoa do investigado".
Atualmente, o inquérito 780 está sendo conduzido pela ministra relatora, em fase de investigação. O que se tem de concreto, até o momento, é o afastamento e a quebra de sigilo bancário dos envolvidos no escândalo, conforme decisão da Corte Especial do STJ no ano passado. O Ministério Público Federal ainda deve decidir se apresentará ou não a denúncia ao Superior Tribunal de Justiça. Em seguida, os ministros votarão se a denúncia se transformará em ação penal a ser julgada pelo STJ.
O Diário do Nordeste entrou em contato com a Secretaria das Cidades por duas vezes para tentar entrevistar o responsável pelo setor de convênios daquela pasta, a fim de questionar sobre as atuais regras implementadas na Secretaria para evitar desvios de verbas como no episódio dos kits sanitários. Entretanto, ninguém quis se pronunciar.
LORENA ALVES
REPÓRTER
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