domingo, 2 de setembro de 2012

Espaço público é desrespeitado por moradores

Fonte: http://diariodonordeste.globo.com
02.09.2012

Em Fortaleza, imóveis são erguidos no meio da rua, demonstrando o crescimento não planejado da cidade
Ruas que se estreitam, ficam sem saída, sofrem ocupação irregular e se transformam em conglomerados de favelas. Há até caminhos com árvores ou residências no meio do logradouro. São muitos os exemplos da forma desordenada que Fortaleza cresceu, desrespeitando os espaços públicos e, sobretudo, os seus moradores.


No bairro Aldeota, o quintal de uma residência ocupa parte da Rua Marechal Rondon. Moradores reclamam dos prejuízos, e especialista cita a necessidade de maior fiscalização, controle e execução de projetos FOTO: FABIANE DE PAULA

Uma cena inusitada, divulgada na última quarta-feira pelo Diário do Nordeste, mostra determinada rua com uma casa no meio do caminho, no Alagadiço Novo, no cruzamento das ruas Mário Alencar Araripe e Neudélia Monte. A imagem chama atenção para a maneira de como a cidade está sendo pensada, sem que haja um planejamento adequado. O caso não é o único. Na Aldeota, o quintal de uma residência foi construído no meio da Rua Marechal Rondon, entre as ruas Desembargador Leite Albuquerque e Eduardo Garcia, ocupando toda a calçada e uma faixa da via. Mais a frente, após passar da casa, a largura da rua volta ao normal.

A doméstica Socorro Santos, de 26 anos, não concorda com o "puxado" que, além de atrapalhar, é considerado uma invasão da via pública. "É praticamente um beco, sem falar que quando fica sem energia elétrica é um prato feito para os assaltantes".

O proprietário da casa, que preferiu não se identificar, comenta que quando foi morar no local, há cerca de dez anos, o quintal já existia. Ele não soube dizer o que foi construído primeiro, se o quintal ou a rua, mas acredita que tenha sido a via.

Clélia Lustosa, professora do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC) e integrante da Rede de Pesquisa Observatório das Metrópoles, destaca que, em Fortaleza, existem muitos planos e projetos, mas não são executados, assim como as leis não são obedecidas. "São leis que nascem mortas", frisa a especialista.

Carências
Um ponto considerado essencial é a fiscalização, além do controle e conservação dos projetos. Clélia diz haver muitos loteamentos na cidade que são feitos por empresas privadas. Conforme a lei, cita, eles deveriam reservar espaço para o sistema viário, áreas verdes e institucionais, o que não acontece. São nesses espaços onde surgem as favelas.

A própria carência da população, acrescenta a professora, que não tem condições de pagar pela cidade, bastante cara de se morar, contribui para o crescimento desordenado. Com os alugueis caros devido à infraestrutura que certas áreas possuem, para a população de baixa renda a saída é morar na periferia ou ocupar de forma irregular os espaços que ainda restam, como aconteceu no Campo do América, no bairro Aldeota, terreno do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A especialista atribui o crescimento desordenado de Fortaleza à falta de fiscalização pelo poder público. A consequência são ruas sem a largura suficiente, áreas verdes e nem espaço de lazer. Nas favelas, as vias são estreitas, porque cresceu sem um planejamento adequado. A exemplo do bairro Serviluz, onde a água de esgoto corre no meio das ruas. Nas áreas que fazem fronteira com a Região Metropolitana de Fortaleza, a professora diz que os moradores ficam abandonados.

A questão do planejamento de uma cidade passa pelo Plano Diretor. O problema é que, em Fortaleza, ele não é posto em prática. Clélia Lustosa comenta que o documento elaborado pela atual gestão não prevê leis complementares à Lei de Uso e Ocupação do Solo, o qual determinaria, por exemplo, a altura dos prédios e a questão da impermeabilidade da cidade. Outro entrave, que considera grave, é a mobilidade, castigando a população que perde muito tempo nos deslocamentos.

"O problema é que o povo não vive mais a cidade. Fortaleza se transformou em uma cidade de muros. Até o Programa Minha Casa Minha Vida foi pensado nesse formato, cheio de muros. Temos que pensar uma cidade mais humanizada. Uma cidade na escala do indivíduo e não do automóvel. O desgaste no tempo dos deslocamentos é muito grande", reforça.

LUANA LIMA 
REPÓRTER

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