Monumentos históricos sem reparos

Fonte: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1144515
03.06.2012


Fora a estátua de Iracema, existem outros monumentos que são representativos, porém estão abandonados
Dentre os monumentos mais conhecidos de Fortaleza está a estátua de Iracema, localizada na Avenida Beira-Mar. Fora ela, a cidade tem outros ícones espalhados por suas praças, e que também são representativos da cidade, tanto na literatura quanto na política, como a escritora Rachel de Queiroz e a militante política Bárbara de Alencar, mas que vivem em estado de depredação constante.

A estátua de Iracema, da década de 1960 e localizada no Mucuripe, está sendo novamente reformada pela Prefeitura de Fortaleza Fotos: Viviane Pinheiro
Rachel tem sua imagem feita em bronze, pelo artista Murilo de Sá Toledo, e encontra-se na Praça dos Leões, no Centro. Já Bárbara de Alencar, foi esculpida em cimento e fica em uma praça que leva seu nome, na Avenida Heráclito Graça, próximo ao Ginásio Paulo Sarasate.

Ambas as obras estão depredadas: Rachel encontra-se sem os óculos de bronze, riscada e suja. Já Bárbara está com a estrutura dos pés e pernas rachadas.

O comerciante Adriano Feitosa, 36 anos, tem uma banca de lanches na Praça Bárbara de Alencar e conta que, apesar da jardinagem do equipamento está em dias, não ocorre o mesmo com a vigilância. "Não vemos um guarda municipal por aqui, os bancos são levados, a imagem muitas vezes é pichada ou quebrada. Caso houvesse fiscalização isso não ocorreria", disse.

Compartilha da mesma opinião de Adriano, o estudante Francisco Victor Silva Batista, 16 anos. Ele mora no bairro de Messejana e relata que a estátua de Iracema, que fica na Lagoa de Messejana, sofre com as mesmas ações de vandalismo.

"Agora que pintaram. Mas antes, era só risco o que se via na estátua. Desta vez, parece que passaram uma tinta contra sprays de pichação, mas o que precisa é de fiscalização", diz.

A escultura da escritora Rachel de Queiroz, porém, que é feita em bronze e está situada na Praça dos Leões, no Centro da Cidade, teve os óculos arrancados
Bem diferente do que ocorre com as estátuas de Iracema, tanto a localizada no Mucuripe, de autoria do artista pernambucano Corbiniano Lins, 88 anos, quanto com a Iracema Guardiã, na Praia de Iracema. A primeira é da década de 60, e neste ano, entra na terceira restauração. Com orçamento de R$ 20 mil, o restauro feito pelo artista Franzé D´Aurora, pretende resgatar em 90% a 97% a obra original.

O coordenador da restauração, João Júlio Sombra, informou que existe a possibilidade de Corbiniano Lins participar do restauro. "Na verdade, ele já está acompanhando. Enviamos fotos da Iracema, e ele faz algumas considerações. O único entrave é a questão da condição física, pois já está em idade avançada", explicou Sombra. Segundo a SER II, o restauro deve ser entregue até o fim de junho.

Conscientização
Sobre a questão, a titular da Secretaria Executiva Regional II (SER II), Rocicleide da Silva, disse que existe um projeto de educação e conscientização da população sobre usos e importância dos monumentos para a cidade. Segundo ela, a Secretaria de Cultura de Fortaleza (Secultfor) está fazendo um levantamento destes equipamentos e, depois, será feita a ação educativa.

"Primeiro ocorre a identificação do patrimônio, estudamos o estágio de depredação e depois partimos para educação patrimonial, onde serão distribuídas cartilhas em que mostraremos o significado e sentido desse patrimônio para o cidadão", disse.

Porém, em nota, a Secultfor afirmou não possuir, ainda, este levantamento, e ter somente os dos bens tombados pelo município. E informou que há previsão de lançar, em junho, um edital para restauração da Cidade da Criança, Passeio Público e do monumento de Cristo Rei, na Praça do Cristo Redentor.

Opinião do especialista

Existe deficiência na formação da nossa sociedade
Doutor Erick Assis de Araújo
Doutor e prof. do Mestrado em História(Uece)
Essa questão tem a ver com nossa formação histórica. Se observarmos com cuidado, a população fortalezense tem um descaso contagiante com aquilo que se convenciona chamarmos de monumentos. Nos dias de hoje, nossa memória é muito difusa, falta solidez, somos marcados por um sentimento de invisibilidade com os monumentos, somos levados ao desdém. Isso é uma deficiência de formação. Para um historiador movido por essas preocupações, isso repercute como sangria, é uma anemia, um enfraquecimento.

Longe de se apoiar em teses alarmistas, o que nos assusta é a falta quase absoluta de compreendermos a noção de contexto. Temos, muitas vezes, uma simpatia por determinado monumento, mas, na maioria das vezes, nada sabemos articular sobre circunstâncias, enfim sobre o precioso conceito de processo. Ora, o que essas considerações têm a ver com o tratamento dado às estátuas de Bárbara de Alencar e Rachel de Queiroz?

O auge para nós historiadores é esse monumento se confundir com documento. Essa ambiguidade significa que eu sei que, além de uma homenagem, uma lembrança, as estátuas de Bárbara e Rachel emanam uma forma de registro, alguém quis me dizer que as duas são dignas de homenagem. O documento Bárbara e Rachel foram registradas por algum ângulo da História, da forma como elas foram registradas elas podem me seduzir por algum viés de interpretação da História.

THAYS LAVOR
REPÓRTER